quarta-feira, 17 de julho de 2013

A Caneta


Bem dito seja Toth que, segundo a Mitologia Egípcia, trouxe a escrita aos moradores das margens do Nilo. A escrita é uma arma que, entre outras coisas, nos ajuda a lidar com os piores tipos de demônios: “Os demônios interiores”. Quem desta arma sabe se utilizar estará apto para o campo de batalha da alma e do coração.

Quando tomo em mãos minha caneta, que pode ser Bic ou não, observo fielmente e muito grato, a sua ponta esférica e dourada, trazendo em si marcas de outras escritas, a tinta azul. A caneta é como a aljava que guarda as flechas de um arqueiro: as palavras. Sabendo manuseá-las, exterminam-se pelotões inimigos. Quando a caneta é utilizada com sentimentos, o escritor sangra ou ejacula através da tinta azul, marcas e cicatrizes da guerra.

Na escrita me adentro em diversos cenários diferentes daquele que estou. Menciono minhas alegrias em um cenário feliz, e as compartilho comigo mesmo, regozijando-me de minhas conquistas, e até mesmo falhas, uma vez que através destas também consegui vitórias. Posso me referir a certos cenários e coloco a mão no peito com enorme saudação e respeito, são cenários de um cinza medonho. Com prazer e um enorme sorriso no rosto me remeto a situações em que cartas de amores foram escritas, mas nunca entregues e de súbito uma lágrima desprende-se de meu olhar. Entre um rabisco e outro, a caneta metamorfoseia-se de espada a buquê de flores do campo.

Amiga fiel, conselheira e psicóloga, estas são algumas das personalidades que uma esferográfica pode assumir, trazendo em sim verdades guardadas em nossos corações. Ela acompanhou o crescimento da Humanidade e junto com esta também se desenvolveu. Tomou várias formas, desde pedras lascadas e afiadas e pinceis, até hoje, tomando a forma de botões eletrônicos: adequa-se às novas gerações.


O apego à fina roliça caneta me remete as penas com tinta que, certamente utilizei em vidas passadas e esta total elegância não me deixa desapegar da tradicional caneta. A ti sou grato minha irmã. Quando estou só, a caneta é minha inseparável companhia, me preenchendo o tempo por horas e até por noites inteiras, não importa qual seja, ela será sempre a caneta, seja acrílico ou metal... Sempre caneta.

Meus íntimos segredos dela não são ocultos. Palavras que me engasgaram na goela encontram via segura em minha caneta. Como duto rígido, leva para o mundo do secreto escrito todos os meus pecados e mentiras verdadeiras que padre nenhum seria capaz de entender.

Já conversei com pessoas sem ao menos comunica-las. Já falei mal de pessoas sem ao menos ofendê-las o ego, simplesmente escrevendo sem lhes remeter os verbetes.  Isso porque a caneta não é fofoqueira, só fala aquilo que a deixo falar por ai! Já declarei meu amor sem ao menos enrubescer o rosto. Na escrita, olhei para dentro da alma alvo de amor, totalmente exposta em uma folha de papel, arrancada de meu melhor caderno.

Bati na cara de meus demônios internos e os exorcizei sem usar cruz nem água benta, usei a caneta, esta estaca poderosa. Com a caneta espantei os fantasmas que sugavam minha alegria e amedrontavam-me no escuro.

Minhas lágrimas já borraram as letras de minha dor, evidenciando um escritor chorão e medroso. A caneta, com suas doces palavras já me secaram tantos prantos que nem me lembro. Se o cão é o melhor amigo do homem, a caneta é a melhor conselheira. Nada contra os cães, eu os amo.

A caneta é libertadora. Ela age como um espelho: expõe a mim mesmo meus erros e meus acertos, meus pecados e minhas glórias, minhas joias e conquistas e até meus defeitos que, não devem ser escondidos, mas sim encarados de frentes e amados da mesma forma que amo certas qualidades de minha alma. Com ela libertei-me dos grilhões do silêncio, pois conversando com ela, posso dialogar comigo mesmo e me amar mais.


Algumas vezes eu inventei felicidades que eu ansiava dentro de mim. Lendo alguns manuscritos, li finais felizes que nunca aconteceram, mas que me concederam um motivo digno para continuar: o desejo de construir um the end como eu queria, o desejo de continuar caminhando em direção ao horizonte, em direção à utopia que nunca se realiza, mas que me mantém evoluindo-me. Nem sempre o fim sucedeu-se como eu planejara, mas até nisso a caneta me ajudou: mostrou-me, através de mim mesmo, portas para novos futuros que eu desejava escrever, mas agora nas páginas da vida.

É preciso ouvir o que a caneta diz. Escutar a caneta exige um olha clínico. Sim, se escuta uma caneta através do olhar! O escrever pode nos enganar e a fantasia escrita pode nos levar à labirintos escuros. Mas a culpa não é da caneta, ela apenas nos confronta consigo mesmo e, até  nas visões oníricas se faz preciso encontrar a verdade que a nós é conferida pela caneta.

Apolo Pensador - Dayvid Fernandes

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